quarta-feira, janeiro 04, 2006

SARAMAGO E A MORTE HUMANIZADA

Não é a melhor obra de Saramago que li, nem tão pouco posso apontar como o livro que deixará referencias que possam trazer modificações em segmentos da sociedade, como o Evangelho Segundo Jesus Cristo (1991), trouxe a Teologia de Libertação ao apresentar um Cristo humano e Revolucionário. Bem como a Caverna (2000), primeiro romance após o Português ter sido agraciado com o Nobel de Literatura em 1998, entusiasmou militantes de esquerda a fazerem criticas a globalização e modernização que gera a exclusão social.

As Intermitências da Morte, recente livro do Marxista e ateu convicto, me deixou impressões muito comuns, não fiquei extasiado com a obra, como das outras vezes em que li o mestre das reflexões de seu tempo. Ganhei o livro de minha filha que me presenteou na brincadeira de amigo secreto em casa de meu pai no Natal. Devorei as 207 paginas em quatro dias.

Como já tinha lido José Saramago, foi fácil ler a ortografia portuguesa em que a obra é publicada, exigência do próprio autor. No Português dos ex colonizadores, não há respeito a vírgulas e a pontos finais. Os parágrafos são poucos e as palavras e frases algumas escritas de forma muito diferente de nosso idioma. Por exemplo: Fato, lá é Facto.

O Nobel de Literatura utiliza-se de ditados populares em seus escritos. Alguns conhecidos, outros desconhecidos, pelo menos deste que escreve este post. Por exemplo: Encanar a perna da Rã. Nunca ouvi falar de tal frase, que significa enrolar, empurrar com a barriga ou o português correto, enganar, mentir. È impossível encanar, ou seja, colocar uma tala na perna de uma rã, pois ela não para quieta em função de sua natureza de pula, pula. A frase lembra-me do comportamento de alguns políticos.

Bem mas vamos ao tema do livro. Um dia a Morte cansada do ser humano, resolve lhe dar uma lição e para de matar. Todas as pessoas do País fictício de Saramago viram imortais. Nesta primeira parte, suscita o debate sobre a indústria da morte em que vivem as instituições.

No segundo tempo, temos um Saramago introspectivo e com maior sensibilidade. A Morte de cruel inimiga do ser humano torna-se humana e amiga dos humanos. Até faz amor, nossa querida Morte.

Bem o livro propõe reflexões que vão desde o que as elites dominantes planejam com a morte afim de concentrar renda, passando pelas espertezas de uma população acostumada ao salve-se quem puder, até o medo que temos de morrer e talvez aí possa existir a novidade, embora tenha visto isto em outras formas de arte, como o cinema com o Sétimo Selo de Ingmar Bergman e Encontro Marcado com Brad Pitt com a Morte humanizada.

Transformar a senhora de nossos sonhos mais macabros em um personagem de carne e osso, faz pensarmos que a vida eterna não exista? que até a morte almeja e anseia as cousas(português clássico) terrenas.

O livro leva a crer que até a morte precisa interromper suas atividades, dar um tempo, que alias é o que sugere o titulo da obra. Em tempos de crise das esquerdas e das instituições, José Saramago lança uma obra que propõe parar com o que fazemos e refletir sobre comportamentos, hábitos, táticas e estratégias políticas e talvez iniciar a pensar no novo.

Embora não seja o melhor, é obra prima. As Intermitências da Morte foram lançadas em 2005 pela editora Companhia das Letras, e pode em Limeira ser encontrado na Livraria IV Centenário.