segunda-feira, março 19, 2007

UM LIVRO


UMA ODE Á VELHICE

As vezes me pego em pensamentos e recordo ou reparo, nas atitudes e comportamentos, dos velhos, os que entram na maior e melhor das idades. Me sinto ridículo, ao constar de que não sou nada, perante a sabedoria e a coragem dos mais velhos. Nas sociedades antigas, tradicionais e tribais, os anciães, eram venerados e respeitados, justamente, por sua capacidade de entender todas as gerações da natureza. Passou por elas, errou e acertou, aprendeu muito mais do que deixou de aprender. Nestes grupos sociais, os mais velhos ocupam papel de destaque e poder. São os que aconselham e decidem. Exalam alegria de viver e espalham compromisso com a vida.

Conheci e conheço, seres humanos que passaram dos 60 de nascimento, que podem perfeitamente assumir o posto de anciães, lideres de sociedades, por demonstrarem nesta fase da existência sua paixão pelo outro e por viver. Minha mãe foi um destes exemplos. Para ela nada era impossível, tudo era tempo para se conquistar e fazer. Era desprendida de qualquer tipo de preconceito. Meu Pai mostrou para os filhos, que nunca é tarde para recomeçar e ser feliz. Minha sogra, após o falecimento de seu marido, enfrentou a vida, criando 09 filhos, todos ainda pequenos. Posso citar inúmeros outros exemplos, inclusive fora do âmbito familiar. Vou ficar em três: Dona Francisca, do bairro Dom Oscar Romero. Nordestina, negra e sem casa. Lutou por moradia, contra a fome e contra o preconceito. Formou com isto uma comunidade solidária e lutadora por seus direitos. Dr Tinoco e Scapi, para mim duas entidades da Revolução Socialista e da Ética Revolucionária. Nenhum dos dois se vendeu a lógica do mercado e da burocracia de esquerda. Tenho saudades de ambos, saudades da sabedoria terna e fraterna.

Lembrei destes Homens e Mulheres, esplendidos, ao ler a obra de um outro ancião sensacional. Gabriel Garcia Márquez. Li em uma noite seu romance, após dez anos sem escrever ficção: “Memórias de Minhas Putas Tristes”. Um livrinho de 37 páginas. Magia pura, uma ficção, que mais parecia uma conto de fadas. Um conto de fadas, que não perdeu-se só em fantasias, mas que ingeriu a realidade no fantástico. Ao propor o tema da velhice, Garcia Márquez, aprofunda o quanto se tortura e maltrata os velhos. Aponta o esquecimento como uma arma, para matar as pessoas que passam da “idade”, ideal da sociedade de consumo e baseada na competição.

Memórias é também, uma declaração de amor. Primeiro á vida, ao viver. Em um relato, de toda sua trajetória humana, um Jornalista no dia em que faz noventa anos, penitencia-se pelas mulheres que magoou, que abandonou. Regozija-se pelos bons momentos que viveu, pelos textos que escreveu e lamenta-se por aqueles que não escreveu. Abomina os amigos que não foram tão amigos assim, e pede perdão por não ter sido amigo de quem devia ser.

Em um lance de achar que a vida esta por um fio, decide realizar um desejo, antigo, que nunca realizou. Tentou com sua fiel empregada, mas o mal jeito e a selvageria sexual, não permitiu que chegasse a concretizar este sonho. Liga para sua antiga cafetina, e exige transar com uma virgem. Como um ultimo desejo, antes de ir para um outro plano, o velho ancião, descobre o paraíso da vida e as vantagens do Amor.

Memórias de minhas Putas Tristes, foi lançada em 2004, com tradução no Brasil de Eric Nepomuceno. Vendeu até hoje mais de 1milhão de exemplares.

Uma Ode poética e apaixonante pela vida e pelo Amor. E mais uma lição que os anciãos deixam para a humanidade.