TEXTO DE AMIGOS
Preconceito
Policiamento 2
Talvez seja este o texto que tenha irritado o Hess. A seguir:
"Cleide estava no telefone público. Quase nem acreditou quando os rapazes contaram a história. Ao abrir o portão, viu o saco plástico com um cacho de banana e dois bilhetes. Em um deles, uma mensagem: "Macaca, gorda, desgraçada. Você vai morrer, vagabunda, ou vai ter que mudar daqui". Ela ficou estarrecida. Ligou para a polícia imediatamente.
Quando o policial chegou ao local, Cleide percebeu uma certa resistência. "É complicado, tem que ter provas para isso", falou o policial. "Moço, eu tenho várias testemunhas que viram que foi ela. Foi ela que jogou essas coisas no meu quintal", retrucou Cleide. "É, mas ela disse que esse pessoal que viu não é confiável", falou o policial. "Mas quem tem que decidir sobre as testemunhas é o juiz, não o senhor", rebateu a mulher.
É por isso que Cleide sustenta uma tese de que não existe democracia racial. "Na realidade, estamos tão atrasados nessa questão que até mesmo o ato de fazer uma denúncia de racismo gera incômodo. As entidades se retraem", critica. Ela ataca as entidades do movimento negro na cidade. Cleide diz ter feito denúncias no Conselho Municipal dos Interesses do Cidadão Negro (Comicin) e até na Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Não houve providência.
SONHO
O episódio narrado ocorreu em outubro. Desde então, ela teve que agregar à rotina nove remédios e participar de terapia de grupo. Entre os remédios para o coração, ansiedade e anti-depressivo, ela faz tratamento para Síndrome do Pânico. E tem dificuldades para dormir. Freqüentemente, acorda sobressaltada. A agressão dilacerou até os sonhos. "O último sonho que tive foi que era apedrejada na rua onde moro", conta, aturdida.
A mulher - que prefere não se identificar completamente para evitar retaliações - encontrou respaldo da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal.
Cleide conta também que o filho já foi alvo de preconceito. "Ele estava em um bar próximo ao Velório Municipal quando chegou um cara, bateu no peito dele e disse: ++Ei, aqui não é lugar para preto não++", diz a mãe.
APARTHEID
O filho da arrecadadora de pedágio Marcélia das Dores Silva sentiu na pele também o poder da indiferença. Segundo Marcélia, ele perdeu uma oportunidade do estágio na administração municipal em virtude da cor da pele. "É de uma forma velada, você nem percebe", observa.
No caso da paulistana Cleide, o ato provocou cicatrizes. Quando saiu de São Paulo, depois de perder o emprego na Secretaria de Transporte Metropolitano na Capital, nunca mais teve um emprego fixo.
"Foi uma escolha infeliz", desabafa. Ela mudou-se para Limeira porque a mãe nasceu na cidade. Hoje, a situação dela não é boa. Para sobreviver, Cleide lixa jóias. Ela está magoada com a vida, mas não desanima. Esboça uma tímida alegria ao dizer que vai concluir o ensino médio este ano. Está em seus planos um curso superior na área de Direito ou Sociologia. "A gente vive em apartheid social", diz.
Para Cleide, o Dia da Consciência Negra, 20 de novembro, foi banalizado. "Vejo como uma campanha de divulgação em massa. É lembrado hoje, porém é esquecido nos 364 dias do ano", reflete. Na visão de Cleide, a data exige profundidade na discussão."
PAULO CORRÊA- Extraído do Blog do Jornalista http://www.pautalivri.blogger.com.br/
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