quinta-feira, março 23, 2006

O OUTRO MUNDO DA CRIANÇA

O documentário "Falcão: Os Meninos do Trafico", parece que chocou parte da intelectualidade e a classe média. Vi o depoimento da autora de telenovelas Gloria Perez sobre o filme. Simplesmente elitista e partenalista. Precisamos fazer alguma coisa, disse ela. Sim precisamos.

Mas primeiro é urgente reconhecer nossos erros, entre eles ignorar a realidade mostrada por MV BILL em sua obra. Disse no post de ontem, que nós cidadãos urbanos, desconhecíamos o mundo dos morros, favelas e bairros de periferia.

Lá a cidadania nunca chegou, ela sequer foi tirada, como em momentos da História Brasileira, a "chocada" classe média, viu seus direitos serem cortados ou tomados, por ditaduras e governos impopulares. No centro do trafico de drogas, reina outra cultura, baseada na defesa da "firma" e dos dividendos do negócio.

Para aqueles garotos relatados no doc. de Bill, a "firma", não pode cair, pois ela garante a sobrevivência e proteção da família dos "Falcões". A linguagem é um mixto de gírias produzidas na comunidade com um português ruim. Apesar de nós "entendidos", não compreender o que falam, a comunicação entre eles é direta e cheia de recados e simbolismos.

O "fiel" é o traficante que introduz o menino na vida do crime. È o professor, o pai. Delega ao "aluno", pequenas tarefas, como esconder armas ou levar "bagulhos", em troca o "fiel", cuida da família do iniciado e lhe ensina o que sabe. È o fim, para nós que temos acesso a direitos, não para eles, que não tem casa para morar, onde os pais não tem emprego decente e com bons salários. È o fim, para nós que temos luz elétrica nas ruas e residências, não para eles que falta tudo para uma vida digna e decente.

O Estado não cumpre sua parte. O trafico substituí o Estado, não levando cidadania e sim evitando que morram de fome. Em troca, a comunidade vê seus filhos e filhas serem soldados do crime organizado.

A classe média ta chocada. Ela deveria pedir perdão. Perdão por omitir-se diante da exclusão social. Perdão por ser tão corporativa e ao mesmo tempo assistencialista e centralizadora. Não adianta chocar-se. È preciso despreender-se dos preconceitos. Ta na hora de recuperarmos os falcões e não continuar abate-los.