quinta-feira, agosto 31, 2006

CHICO BUARQUE MAIS OU MENOS COMO ESCRITOR


Meu amigo Mauro José, enviou vários livros de seu acervo on line. Informei aqui no Blog, sobre as mais de 500 obras que o garoto, baixou da rede. Entre estas perolas, três li com muita expectativa. Falo de 2 livros e um roteiro de espetáculo teatral, assinados por Chico Buarque de Holanda. O velho Chico, é para mim o maior letrista do mundo. Sua capacidade para escrever canções em língua portuguesa, chega a perfeição de um Fernando Pessoa, de um Plabo Neruda ou Gabriel Garcia Márquez. Em algumas obras, o filho de Sergio, chega a reinventar a língua, com expressões do ideário popular, do folclore, do cotidiano e assim por diante.

As Histórias de Chico, nas músicas, fizeram referencias na política, no amor, na cultura popular. Embalaram passeatas, noites nas prisões da ditadura militar, filhas de generais. Ditaram momentos conjunturais e estruturais. Chico Buarque é nosso patrimônio Histórico e deve ser cultuado e lembrado, no agora e sempre. Porem como escritor, o poeta é mais ou menos.

Em duas semanas li Estorvo seu primeiro Romance(), Budapeste seu segundo e Opera do Malandro, seu quarto espetáculo teatral. Vou descrever um por um, um na ordem em que foi lido.

ESTORVO

Uma narrativa, lenta porem cria uma atmosfera, de suspense o tempo todo. É um texto sobre manias e medos, que o ser humano, cultua, uns mais outros menos. Eu por exemplo, tenho a mania, de narrar partidas de futebol ou programas esportivos, enquanto estou pensativo. Mania de passar o tempo e relaxar. Estorvo, faz pensar que determinadas manias, são perniciosas as pessoas, perniciosas e perigosas. Um sujeito, que não trabalha ou não quer nada fazer, transforma em um entrave, um estorvo mesmo, ao caminhar da vida. Esperava mais deste argumento, talvez um desenvolvimento que envereda-se por organizações políticas, criminosas, questão que a obra ensaia trabalhar, quando o personagem principal, esbarra em seu sitio com traficantes de drogas e outros perpedicalhos. Tanto este como Budapeste tem três características idênticas: 1- As Histórias são contadas pelo próprio personagem principal, que cumpre o papel de narrador; 2- Elas são Universais, percorrem vários lugares do planeta; 3- Terminam sem um epílogo final, dando a impressão de continuísmo ou seqüência da História. As vezes, fiquei cansado com a narração. Parecia uma corrida sem linha de chegada. Uma correria sem conta. Não gostei do roteiro, podia ter sido melhor.

BUDAPESTE

A mesma lentidão, apesar da correria, de Estorvo. Aqui o enredo, ousa mais do que no Romance de estréia. Trabalha vários temas, entre eles o Internacionalismo, contra a Xenofobia, a futilidade e principalmente a exploração. Chico desenha um personagem, que dá vida a pessoas, que aparentemente são medíocres, em suas áreas de atuação, bem como em suas vidas. Políticos, que fazem carreira, com discursos e artigos, escritos pelo Silva, o narrador da História. Sujeitos classe média, que tentam dar maior sentido na vida, contando Histórias vividas ou não. Escritores e poetas, ridículos, que se transformam em grandes best sellers, através da escrita de Silva. Tanto a vida do escritor anônimo, como a de seus fregueses, é uma farsa, um engodo, para ganhar dinheiro e fama. Neste conteúdo de farsas, entramos no universo do Leste Europeu, em especifico Budapeste, capital da Hungria. Na verdade os Húngaros, entram no livro, para alegoricamente, e Chico gosta de usar símbolos, por na pauta o que aconteceu depois da queda do muro de Berlin. Budapeste não é um Romance político, mas questiona as manipulações e artimanhas políticas feitas em todos os setores da sociedade. Gostei mais que Estorvo. Porem carece ainda de maior dinâmica. Alguns trechos são confusos, atrapalhando o desenrolar da História. Como em Estorvo, Chico alterna o tempo real com Flachs Back. Mas no primeiro foram perfeitos, aqui prejudicaram um pouco para compreender o que estava rolando na estória.

OPERA DO MALANDRO

A melhor das três obras lidas. Um roteiro, que alegoricamente, como sempre nas canções e livros de Chico, a Opera repleta de musicas fantásticas e de sucessos, como Geni e o Zepellin, Folhetim, Teresinha, Meu Amor, Malandro, A Volta do Malandro, Pedaço de Mim, traz a discussão da modernidade e do desenvolvimento Capitalista. Ambientado nos anos 30, em pleno Estado Novo, a peça, incute o que foi aqueles anos de Americanização do Brasil, na definição de Luís Werneck Viana, na apresentação do roteiro. A industrialização em aversão ao mundo agrário, coloca em pauta não só temas como imperialismo e concentração de renda, mas também o cultural, que modifica-se a partir da nova concepção de poder. O Brasil de Getulio Vargas, narrado por Chico Buarque, é retratado no submundo do crime, onde o novo, o moderno é representado, pelo contrabandista de bugigangas estrangeiras. O atraso tecnológico e cultural, tem em um dono de uma rede de prostíbulos e casa de espetáculos, sua personificação. A policia e as autoridades eletivas, servem a estes dois senhores. Os trabalhadores, aqui retratados pelas prostitutas, gays e gângsteres, são usados e abusados pelos 2 lados de uma mesma moeda, o Capital. O Espetáculo é montado em 1978, as vésperas da proclamação da Anistia e em plena efervescência, contra a ditadura. Temas como de mudanças visando um futuro para o povo, sofre uma nova alegoria, com este espetáculo. Chico capricha no vocábulo e nas canções. O elenco desta primeira montagem é simplesmente sublime: Otavio Augusto, Marieta Severo, Ari Fontoura, Elba Ramalho, Claudia Gimenez e outros, com a direção competente de Luis Martinez Corrêa.